A carta de Filemom retrata belamente a doutrina da identificação do crente com Cristo. Paulo pede: "E tu torna a recebê-lo como ao meu coração" (v.12). Onésimo tornara-se uma parte tão importante na vida de Paulo que lhe doía mandá-lo de volta para casa!
O versículo 17 apresenta as palavras de Jesus
Cristo a respeito de todo crente verdadeiro: "Recebe-o, como se fosse a
mim mesmo"! Somos aceitos "no Amado" (Ef 1:6). Onésimo não
era a mesma pessoa de antes. Agora, ele tinha uma posição totalmente distinta diante
de seu senhor: ele era um irmão amado, identificado com Paulo e, por isso,
aceito. Isso é o que a Bíblia quer dizer com justificação: estamos em Cristo e,
por isso, somos aceitos diante de Deus.
A carta é um retrato tocante do Calvário. Cristo encontrou-nos como escravos fugitivos, infratores da lei, rebeldes, mas ele perdoou-nos e identificou-nos com ele mesmo. Ele foi para a cruz e pagou a dívida por nós. Essa é a doutrina da imputação. O verbo "imputar" significa "pôr na conta de alguém". Nossos pecados foram postos na conta de Cristo, e a justiça dele é posta em nossa conta quando cremos nele.
Que graça magnífica! Nossos pecados foram postos na
conta de Cristo, embora ele não cometesse pecado (2Co 5:21). Nossos pecados foram
imputados a ele, e seu manto de justiça, a nós.
1. ONÉSIMO SE TORNA ÚTIL PARA PAULO – v.11-13
O nome Onésimo quer dizer "útil",
de modo que Filemom 11 apresenta um jogo de palavras. (O nome Filemom quer
dizer "afetuoso" ou "aquele que é bondoso".
“O cristianismo é o poder que pode fazer com que
os homens maus sejam bons.” (James Denney)
É significativo notar que Paulo declara que em
Cristo a pessoa inútil se converte em útil. Para a última coisa que foi criado
o cristianismo é para produzir pessoas ociosas, ineficazes, sonhadoras e
indefinidas; ao contrário, o evangelho produz gente útil, que tem um sentido
das coisas, que pode fazer uma tarefa melhor que outros.
Paulo chama Onésimo o filho que gerou em suas
prisões. Levar um homem a Cristo, guiar um homem a Deus, é tão grandioso como
tê-lo trazido ao mundo. Feliz é o pai que traz seu filho à vida, e que logo o
guia na vida eterna, porque então este filho será seu por partida dupla.
No versículo 12 Paulo está dizendo a Filemom:
"Estou te remetendo o caso de Onésimo, para que dês um veredicto que
concorde com o amor que teria que ter." Onésimo se tornou alguém muito
querido para Paulo durante esses meses da prisão, porque Paulo o elogia muito
ao dizer que mandar-lhe a Filemom é como enviar-lhe um pouco de seu próprio
coração.
2. A UTILIDADE DE ONÉSIMO PARA FILEMOM – v.14-16
Paulo teria gostado de ficar com Onésimo, mas o
envia de volta a Filemom, porque não deseja fazer nada sem o consentimento dele.
Mais uma vez aqui há um fato significativo.
O cristianismo não existe para ajudar os crentes a
escaparem do seu pecado; existe para capacitar seus seguidores a enfrentar o
passado e a elevar-se acima dele. Onésimo tinha escapado. Não se devia permitir
que evitasse as consequências de seus equívocos. Devia voltar, e enfrentar as
consequências do que tinha feito; e logo devia aceitá-las e elevar-se acima
delas. O cristianismo não é nunca uma escapatória: é sempre uma conquista.
Mas Onésimo retorna com uma diferença. Foi embora
como um escravo pagão; volta como um irmão em Cristo. Vai ser duro para Filemom
considerar como irmão a um escravo fugitivo; mas é exatamente o que Paulo lhe
ordena. Paulo diz: "Se está de acordo em que eu seja seu companheiro na
obra de Cristo, e que Onésimo é meu filho na fé, então deve recebê-lo como se
me recebesse a mim mesmo."
Aqui outra vez há algo muito significativo. O
cristão deve sempre dar as boas-vindas à pessoa que se equivocou.
Muitas vezes consideramos com suspeita a pessoa que
se equivocou e que tomou o mau caminho; muitas vezes demonstramos que nunca
estaremos preparados a confiar nele outra vez. Podemos crer que Deus o
perdoará; mas para nós será difícil fazê-lo.
Tem-se dito que o mais reconfortante a respeito de
Jesus Cristo é que Ele confia em nós exatamente nas mesmas circunstâncias de
nossas derrotas. Quando alguém se equivoca, o caminho de volta pode ser muito duro,
e Deus não perdoará imediatamente à pessoa que, em seu farisaísmo ou em sua
falta de simpatia, faz mais difícil que o pecador se recupere.
3. PAULO COMO UMA FIGURA DE CRISTO – v.17-19
O termo traduzido por "companheiro" é koinonia,
que significa "ter em comum". Em Filemom 6, é traduzido por
"comunhão". Paulo oferece-se para ser "sócio" de Filemom e
ajudá-lo a resolver o problema com Onésimo. Faz duas sugestões: "recebe-o,
como se fosse a mim" e "Lança tudo [o que ele roubou de ti] em
minha conta".
Isto trata-se de uma ilustração do que Jesus
Cristo fez por nós, os que cremos nele. O povo de Deus é identificado de tal modo
com Jesus Cristo que ele nos recebe da mesma forma como recebe seu Filho! Somos
aceitos "no Amado" (Ef 1:6) e vestidos com sua justiça (2 Co 5:21).
Por certo, não podemos nos aproximar de Deus por algum mérito próprio, mas Deus
nos recebe quando nos achegamos a ele "em Jesus Cristo". O termo
"receber", em Filemom 17, significa "receber no seu círculo
familiar". Imagine um escravo ser aceito na família de seu senhor! Mais
maravilhoso ainda é um pecador perdido ser aceito na família de Deus!
Paulo não sugere que Filemom ignore os crimes do
escravo e esqueça o que Onésimo lhe devia. Antes, oferece pagar essa dívida do
próprio bolso: "lance tudo em minha conta e eu pagarei". A
linguagem que Paulo usa em Filemom 19 é muito parecida com a de uma nota
promissória legal da época. Essa é a garantia do apóstolo a seu amigo de que a
dívida seria paga.
É preciso mais do que amor para resolver problemas;
o amor deve pagar um preço. Deus não nos salvou por seu amor,
pois, apesar de amar o mundo inteiro, nem todos são salvos. Deus salva os
pecadores pela graça (Ef 2:8,9), e a graça é o amor que paga um preço.
Em sua santidade, Deus não poderia ignorar nossa dívida, pois Deus deve ser
fiel à própria Lei. Assim, ele pagou a dívida por nós!
Os teólogos chamam isso de "doutrina da
imputação" (imputar significa "depositar na conta").
Quando Jesus Cristo morreu na cruz, meus pecados foram colocados na conta dele,
e o Senhor foi tratado da maneira como eu deveria ter sido. Quando o aceitei como
Salvador, sua justiça foi depositada na minha conta, e, agora, Deus me aceita
em Jesus Cristo. Jesus disse ao Pai: "ele não lhe deve mais coisa alguma,
pois eu paguei tudo na cruz. Receba-o como receberia a mim. Aceite-o no círculo
da família!"
Filemom 19 dá a entender que foi Paulo quem levou
Filemom à fé em Cristo. O apóstolo usa esse relacionamento especial para incentivar
o amigo a receber Onésimo. Filemom e Onésimo não eram apenas irmãos espirituais
no Senhor, mas também tinham o mesmo "pai espiritual" - Paulo!
4. PAULO ESPERA MAIS DE FILEMOM – v.20-22
No versículo 20 escutamos a Paulo falando com uma
tintura de humor. Diz: "Filemom, deve-me sua alma, porque fui eu quem te
levou a Cristo. Deixarás que obtenha algum lucro de ti?" Com um sorriso
afetuoso Paulo está dizendo: "Filemom, recebeste muito de mim; deixa que
agora eu receba algo de ti!"
O versículo 21 é típico do relacionamento de Paulo
com as pessoas. Uma norma de Paulo era a de esperar sempre o melhor dos demais.
Nunca duvidou que Filemom cumpriria o seu pedido. É uma boa norma; esperar o
melhor dos demais é quase sempre estar na metade do caminho que nos leva a
obter o melhor. Se esperarmos pouco, obteremos pouco. Mas se apelarmos à honra
de uma pessoa, demonstrando-lhe que esperamos muito dela, o dormido
cavalheirismo do coração humano despertará, e obteremos muito daquele do qual esperamos
muito.
No versículo 22 fala o otimismo de Paulo. Até na
prisão crê que voltará a ser livre pelas orações de seus amigos. Agora mudou
seus planos, ele sentia que devia deixar os lugares distantes e os limites da
Terra aos homens mais jovens, e que para ele, à medida que se aproximava ao
final, os velhos amigos eram o melhor.
Paulo encerra esta carta com seus pedidos e
saudações pessoais costumeiros. Estava certo de que seria liberto e visitaria Filemom
e Áfia em Colossos (como indica o uso dos pronomes no plural em Fm 22). Até mesmo
esse fato serviria de incentivo a Filemom seguir as instruções de Paulo, pois certamente
não desejava sentir-se envergonhado ao se encontrar pessoalmente com o
apóstolo.
5. OS COMPANHEIROS DE LUTA – v.23-25
Como vimos, é provável que Epafras fosse o
pastor da igreja e que havia ido a Roma para ajudar Paulo. Não sabemos se ele
era um "prisioneiro voluntário" por amor a Paulo ou se era, de fato,
prisioneiro dos romanos. De qualquer modo, devemos louvá-lo por sua dedicação a
Cristo e ao apóstolo.
João Marcos, que estava
com Paulo (Cl 4:10), era o rapaz que o havia abandonado na primeira viagem
missionária (At 12:12, 25; 15:36-41). Paulo havia perdoado Marcos e era grato
pelo seu ministério fiel (ver 2 Tm 4:11).
Aristarco era de
Tessalônica e acompanhou Paulo a Jerusalém e, depois, a Roma (At 19:29; 27:2).
Demas é mencionado
três vezes nas cartas de Paulo (Fm 24; Cl 4:14) e "Porque Demas, tendo
amado o presente século, me abandonou" (2 Tm 4:10). João Marcos falhou,
mas foi restaurado. Demas parecia estar indo bem, mas caiu.
Lucas, obviamente, é
o "médico amado" (Cl 4:14) que acompanhou Paulo, ministrou ao
apóstolo e, por fim, escreveu o Evangelho de Lucas e o Livro de Atos.
Aplicações:
1. Em Cristo deixamos de ser um nada e nos tornamos
úteis, nossa vida passa a fazer sentido, podemos realizar tarefas para abençoar
outros e para que o reino de Deus avance na sociedade.
2. Não devemos fugir do passado, antes devemos
entregá-lo a Cristo, receber o perdão e começar uma vida nova agindo de forma
diferente. Em Cristo podemos ser maiores que nosso passado.
3. Nossos pecados foram colocados sobre Cristo, ele
pagou o preço para que pudéssemos receber dele a graça da salvação e assim
sermos aceitos por Deus na eternidade.
4. Jesus sempre vai esperar mais de nós: mais
compromisso, mais liberalidade, mais envolvimento e participação, mais
misericórdia, mais amor, etc.
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